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Bateu asas e voou: relatório critica proibição do comércio de espécies silvestres

Por silperman

Por Vandré Fonseca

Estudo sobre comércio de aves na Amazônia afirma que a proibição no Brasil pôs fim a um período de exageros, mas impediu que país aproveitasse economicamente a biodiversidade.

Manaus ‒ A proibição da venda de animais silvestres pode ter contribuído para reduzir, e muito, o tráfico internacional de aves sul-americanas. Mas depois de cinco décadas de proibição, especialistas apontam que as políticas restritivas de países como o Brasil, Colômbia, Bolívia e Equador levaram essas nações a abrir mão de um negócio lucrativo, e que também tem contribuído no combate ao tráfico ilegal e conservação: a criação e comercialização de espécies silvestres.

Essa conclusão está no relatório Bird’s-eye view: Lessons from 50 years of bird trade regulation & conservation in Amazon countries (Visão com olhos de pássaro: Lições de 50 anos da regulamentação do comércio e conservação nos países amazônico, em uma tradução livre), divulgado nesta quarta-feira (16) pela organização não governamental internacional Traffic, com apoio do WWF. A Traffic atua para que o comércio de espécies selvagens não seja uma ameaça à conservação da natureza, segundo afirma a página da organização na internet.

O relatório destaca que a proibição pôs fim ao comércio predatório que estava dizimando espécies sul-americanas até a década de 1960. Cita o exemplo de 25 mil beija-flores caçados no estado do Pará, em 1932, para servirem de enfeite em caixas de chocolate na Itália. Porém a proibição, determinada a partir de 1967, impediu que o Brasil e vizinhos amazônicos desenvolvessem alternativas econômicas rentáveis para aproveitar e proteger a biodiversidade.

O Brasil possui a terceira maior diversidade de aves do mundo, atrás da Colômbia e do Peru. Entre os dez países com maior número de espécies de aves registradas, seis são amazônicos (Além dos três já citados, Equador, Bolívia e Venezuela). Com tanta riqueza batendo asas na região, turismo de observação de aves é apontado como um importante incentivo econômico a preservação das aves.

Proibição criou oportunidades, no exterior

Arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus) voa no Pantanal. Foto: Fábio Pellegrini.

A proibição do comércio no Brasil, aponta o relatório, não evitou que milhares de pássaros tenham saído ilegalmente do país. Estima-se, segundo o texto, que até 10 mil araras-azuis (Anodorhynchus hyacinthinus) tenham sido contrabandeadas, inclusive com documentação obtida em países vizinhos, como Argentina, Bolívia e Paraguai. Como resultado, as Filipinas se tornaram o maior exportador de araras-azuis. Ao Brasil restou investir em ações intensas de conservação, para recuperar a população selvagem que estava desaparecendo.

O estudo lembra ainda que a recuperação de espécies protegidas da exploração comercial encontra obstáculos, como a degradação ambiental, poluição e perda de habitats, que afetam tanto espécies comerciais quanto as outras. Das 1809 espécies de aves que ocorrem no Brasil, segundo o texto, 170 estão classificadas como ameaçadas, pelos critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Mas o relatório faz críticas às políticas restritivas, que impediram de buscar alternativas à captura de animais silvestres e impediram o Brasil de lucrar com a sua biodiversidade. “O Brasil produziu a situação oposta a de um monopólio: involuntariamente, colocou o direito de se beneficiar comercialmente de suas espécies autóctones nas mãos de qualquer outro país que escolhe lucrar com elas”, afirma um trecho do estudo, assinado pelo biólogo Bernardo Ortiz-von Halle, diretor da Traffic na América do Sul.

A África do Sul, citada no relatório, se tornou o maior exportador mundial de papagaios sul-americanos entre os anos 2000 e 2013, graças a reprodução em cativeiro. O país africano exportou, durante esse período, 144.088 aves de espécies sul-americanas, o que significa 22% de todas as vendas no mercado internacional. No total, mais de 650 mil papagaios sul-americanos foram vendidos em todo o mundo, ao longo desses anos. Só 49% do total, por países do continente.

Vinte e três cacatuas e um papagaio foram encontrados amontoados em garrafas plásticas de água a bordo de um navio na Indonésia. Foto: Petrus Riski/Mongabay.

Em relação ao Brasil, o relatório destaca ainda a ameaça representada pelo comércio ilegal de pássaros dentro do território Brasileiro, que não tem sido evitado pelas leis que impedem a comercialização e regras impostas sobre criadores. O texto cita que, segundo o Ibama, 38 milhões de aves são retiradas na natureza para serem vendidos ou terem partes de seu corpo, como as penas, vendidos. Porém, apenas uma ínfima fração desse número, 35 a 40 mil animais, são apreendidos.

Relatório pede abordagem mais realista sobre o tráfico de animais

Na conclusão, Halle afirma, em outras, que a criação de aves como animais de estimação é um costume que não será abandonado tão cedo. E também que as unidades de conservação não garantem total proteção aos animais que vivem dentro delas. Ele pede uma abordagem mais realista do problema.

Para Halle, a marginalização de criadores profissionais podem ter afetado oportunidades de conservação de muitas espécies brasileiras. A necessidade do país recorrer a criadores estrangeiros é uma demonstração de que o país estaria equivocado em suas políticas restritivas, adotadas há mais de 50 anos.

“Enquanto isso, traficantes profissionais da vida selvagem e suas redes criminosas, aqueles que estão atrás das espécies mais valiosas, raras e ameaçadas, operam seus negócios aproveitando as múltiplas oportunidades que o país oferece: tamanho, pobreza, corrupção, fraco sistema legal, complexidades institucionais e desarticulação dos esforços”, afirma Halle, na conclusão.

Fonseca é jornalista especializado em Ciências e Meio Ambiente. Graduado em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela Faculdade de Comunicação Social Casper Líbero (1996).

Fonte: ((o))eco

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